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terça-feira, 25 de março de 2014

Conselhos para ser um anticomunista de sucesso


50 ANOS DO GOLPE MILITAR NO BRASIL



"O anticomunismo está na moda, como na Guerra Fria. Com uma novidade: nunca tantos malucos foram tão barulhentos, ao menos no Facebook e em marchas. Não é preciso muito: basicamente, você só tem de ser relativamente ignorante e repetir feito um papagaio algumas poucas palavras e expressões como “petralha ladrão”, “lulopetista”, “Miami é que é bom”, “isso aqui não tem jeito”. Esse é um bom começo.

Mas a verdade é que os socialistas estão batendo às nossas portas, ameaçando as nossas famílias e, se você quiser fazer sucesso numa festa de gente burra e sem noção da realidade, eis alguns conselhos importantes para se tornar um novo anticomunista." 

16 conselhos para você fazer sucesso como um novo anticomunista

Kiko Nogueira*


A ameaça vermelha é real. Denuncie toda atividade comunista suspeita.


O anticomunismo está na moda, como na Guerra Fria. Com uma novidade: nunca tantos malucos foram tão barulhentos, ao menos no Facebook e em marchas. Não é preciso muito: basicamente, você só tem de ser relativamente ignorante e repetir feito um papagaio algumas poucas palavras e expressões como “petralha ladrão”, “lulopetista”, “Miami é que é bom”, “isso aqui não tem jeito”. Esse é um bom começo.

Mas a verdade é que os socialistas estão batendo às nossas portas, ameaçando as nossas famílias e, se você quiser fazer sucesso numa festa de gente burra e sem noção da realidade, eis alguns conselhos importantes para se tornar um novo anticomunista. 

1. Insista que o marxismo está desacreditado, desatualizado e totalmente morto e enterrado. Em seguida, faça uma carreira lucrativa batendo nesse cavalo morto pelo resto da sua vida. 

2. Comunismo ou marxismo é o que você quiser que seja. Sinta-se livre para rotular países, movimentos e regimes como “comunistas”, independentemente de coisas como ideologia, relações diplomáticas, política econômica etc. 

3. Se houver um conflito envolvendo comunistas, todas as mortes devem ser culpa do comunismo. Tenha cuidado ao aplicar isto à Segunda Guerra Mundial. Fascistas que lutaram contra os soviéticos tudo bem, mas tente não elogiar abertamente a Alemanha nazista. Deixe isso para conversas privadas. 

4. Cite constantemente George Orwell. Fale da “Revolução dos Bichos” ou de “1984”. Diga que Lula é o Grande Irmão. 

5. Cite Reinaldo Azevedo, Rodrigo Constantino, Olavo de Carvalho. Cite Nelson Rodrigues, que você nunca leu e não entende muito bem, mas isso não vem ao caso. 

6. Mencione quantidades maciças de “vítimas do socialismo” sem se importar com demografia ou consistência. 3 milhões de pessoas mortas de fome? 7 milhões? 10 milhões? 100 milhões no total? Você não precisa se preocupar com ninguém verificando se é verdade, o que é bom já que você não tem a menor ideia. 

7. Diga que o petismo, o socialismo, o marxismo ou o psolismo são um tipo de fé religiosa, messiânica, ou qualquer outra besteira que possa inventar. Quando as pessoas disserem que é possível traçar semelhanças entre qualquer ideologia política e uma religião, ignore-as. 

8. Duas palavras: natureza humana. O que é a natureza humana? Para seus propósitos, a natureza humana é uma maneira rápida de explicar por que as idéias políticas de que você não gosta estão erradas. 

9. Use palavras como “liberdade” e “democracia” constantemente. Não aceite qualquer desafio para definir esses termos. 

10. Você não quer um golpe, você quer uma intervenção militar, o que está garantido na Constituição. Não está, mas repita essa frase. 

11. Diga “Vai pra Cuba, vagabundo” a qualquer pessoa que discordar de você sobre qualquer assunto. 

12. Esquerdistas podem ser usados a favor ou contra o que for mais adequado no momento. Se você estiver numa turma mais conservadora, os esquerdistas são gayzistas. Se você estiver no meio de gente mais descolada, os esquerdistas são homofóbicos. Essencialmente, os esquerdistas são degenerados e puritanos ao mesmo tempo. 

13. O Mais Médicos é parte de um plano de infiltração cubana no Brasil. 

14. Você não precisa saber o que é bolivarianismo para acusá-lo de ser responsável por tudo o que está errado na América do Sul. O bolivarianismo destruiu a Venezuela e destruirá o Brasil. É uma espécie de saúva. 

15. O papa é comunista. 

16. Nova Ordem Mundial. Quando se esgotarem todos os argumentos, diga: “Nova Ordem Mundial”. E saia para não ser obrigado a explicar que se trata de uma teoria conspiratória estúpida.


* Diretor-adjunto do Diário do Centro do Mundo. Jornalista e músico. Foi fundador e diretor de redação da Revista Alfa; editor da Veja São Paulo; diretor de redação da Viagem e Turismo e do Guia Quatro Rodas.
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As Marchas da Família e a apologia a crime


50 ANOS DO GOLPE MILITAR NO BRASIL



"E aí o que nós vimos no fim de semana foi outro fenômeno político.

Em vez de ser rejeitado de forma absoluta pretendeu-se dispensar à ideia de um golpe de Estado um tratamento relativo, com argumentos supostamente equilibrados, ora contra, ora a favor.

Vamos 'debater' a ditadura? Procurar seu lado 'bom'?

É inaceitável. O que se fez na rua no fim de semana foi a apologia de um crime. (...)


Após três derrotas consecutivas em eleições presidenciais, ameaçados de enfrentar um quarto fracasso em outubro, conforme dizem todas as pesquisas de intenção de voto, os filhos, netos e bisnetos ideológicos dos golpistas de 64 sonham com uma revanche. (...)

Não suportam a possibilidade de enfrentar mais quatro anos longe do poder, com um governo que, apesar de muitos trancos, barrancos e solavancos, tem conseguido manter uma política de distribuição de renda, preservação com emprego e dos salários."



Tiazinha marchadeira, pedindo atentado 
à Constituição da República


Golpistas e maconheiros


Paulo Moreira Leite*

Enquanto jovens que querem legalizar a maconha são tratados na pancada, quem defende golpe militar é tratado a pão de ló


A importância dos protestos a favor de um golpe militar no fim de semana reside em sua desimportância.

O povo fez sua parte. Ao ignorar as manifestações, demonstrou sua rejeição a aventuras contra a democracia e contra a liberdade.

Os sociólogos e analistas políticos que adoram falar numa "cultura autoritária" do brasileiro, sempre útil quando se quer achar uma justificativa para o próprio autoritarismo, já estavam com o argumento no bolso para ser utilizado caso algum protesto tivesse reunido um pouco de gente a mais. Tiveram de ficar em silêncio.

O fiasco da marcha dos golpistas não terminou bem para todo mundo, porém. A marcha foi tratada de forma tolerante, hospitaleira até, por determinados meios de comunicação.

O que se viu foi o seguinte.

- Você vai ao cinema?

- Não. Vou pedir um golpe de Estado.

E isso é grave, até porque não resiste a uma comparação.

Há vários anos que assistimos a um ritual conhecido. Toda vez que estudantes e jovens procuram organizar uma marcha pela legalização da maconha, surgem vozes dispostas a proibir a manifestação. Mesmo reconhecendo que vivemos num país onde a liberdade de expressão é um direito fundamental, não faltam questionamentos.

Já em 2010, o desembargador Sergio Ribas afirmou:

"Enquanto não houver provas científicas de que o 'uso da maconha' não constitui malefícios à saúde pública e que a referida substância deva sair do rol das drogas ilícitas, toda tentativa de se fazer uma manifestação no sentido de legalização da 'maconha' não poderá ser tida como mero exercício do direito de expressão ou da livre expressão do pensamento, mas sim, como sugestão ao uso estupefaciente denominado vulgarmente 'maconha', incitando ao crime, como previsto no artigo 286, do Código Penal, ou ainda, como previsto na lei especial, artigo 33, 2º, da Lei 11.343/2006."

Um ano antes, em 2009, a desembargadora Maria Tereza do Amaral já havia dito que: "não se desconhece o direito constitucional à liberdade de expressão e reunião, que, à evidência, não está se afrontando neste caso, porquanto, não se trata de um debate de idéias, mas de uma manifestação de uso público coletivo da maconha".

Não sou a favor da legalização da maconha. Mas admito que há um lugar para que isso seja debatido em nossa sociedade e que as pessoas favoráveis à medida possam expressar-se. O argumento para proibir a marcha da maconha dizia que a liberdade de expressão também tem limites numa sociedade democrática, principalmente quando atenta contra a ordem pública/jurídica, ou a paz social.

Ordem pública? Paz social? Com golpe?

Pergunto por que esses mesmos questionamentos não foram feitos diante da marcha dos golpistas.

Acho que ninguém precisa de "provas científicas" de que as ditaduras fazem mal à nossa vida pública.

Não estamos falando de uma medida pontual, que diz respeito a uma droga específica, como a maconha, mas de uma garantia fundamental do Estado de Direito. A democracia, para os brasileiros, não está mais em discussão desde 1988, pelo menos. Naquele ano, ela entrou na Constituição como cláusula pétrea – que não pode ser reformada e que, conforme entendimento do Supremo, o Congresso sequer tem o direito de debater se irá reformar ou não. O artigo 60 da Carta diz:

"Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

I - a forma federativa de Estado;

II - o voto direto, secreto, universal e periódico;

III - a separação dos Poderes;

IV - os direitos e garantias individuais.

Isso quer dizer o seguinte. Não se pode debater o retorno da censura nem da tortura nem tentar legalizar o racismo. O voto direto não pode ser abolido e assim por diante.

Desse ponto de vista, o que se viu no fim de semana foi puro absurdo – reforçado quando se verifica o tratamento dispensado aos garotos que pediam a legalização da maconha. Eles tomaram porrada. Foram feitas prisões. Com o pretexto de que eles pretendiam fumar maconha na rua – o que é proibido e pode ser punido na forma da lei – proibiu-se que manifestassem sua opinião, o que é perfeitamente legítimo.

E aí o que nós vimos no fim de semana foi outro fenômeno político.

Em vez de ser rejeitado de forma absoluta pretendeu-se dispensar à ideia de um golpe de Estado um tratamento relativo, com argumentos supostamente equilibrados, ora contra, ora a favor.

Vamos "debater" a ditadura? Procurar seu lado "bom"?

É inaceitável. O que se fez na rua no fim de semana foi a apologia de um crime.


Mas dá para compreender como manifestação política.

A experiência ensina que a democracia sempre se torna um valor relativo quando deixa de atender a determinados interesses. Nessas horas, as juras de amor pelo regime são acompanhadas de muitos mases, poréns, entretantos e todavias... Erros, falhas, incongruências de um governo são apresentados como falhas do próprio sistema, como justificativas para questioná-lo nas entrelinhas.

Fico imaginando se alguém questiona a democracia, nos Estados Unidos (nos Estados Unidos!) toda vez que Barack Obama tem o governo paralisado porque atingiu o limite de gastos no orçamento.

É isso o que se vê hoje e nós sabemos muito bem por que. Após três derrotas consecutivas em eleições presidenciais, ameaçados de enfrentar um quarto fracasso em outubro, conforme dizem todas as pesquisas de intenção de voto, os filhos, netos e bisnetos ideológicos dos golpistas de 64 sonham com uma revanche.

Acredite: sonham com uma Venezuela e o sufoco imposto a Nicolas Maduro.

Não suportam a possibilidade de enfrentar mais quatro anos longe do poder, com um governo que, apesar de muitos trancos, barrancos e solavancos, tem conseguido manter uma política de distribuição de renda, preservação com emprego e dos salários.

Confiando na perda de memória de 1964, os marchadeiros de 2014 mostram que perderam até a vergonha. Têm coragem de falar que só querem uma intervenção pontual, de curta duração. Nem neste aspecto são originais.

No 1 de abril de 1964, é bom lembrar, falava-se numa intervenção tão curta que os militares iriam se retirar a tempo da retomada do calendário eleitoral, em 1965.

O país foi obrigado a atravessar um quarto de século de treva autoritária antes de recuperar seus direitos soberanos.


IstoÉ

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