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quinta-feira, 13 de junho de 2013

SP: 20 centavos de aumento e o caos na cidade


OPINIÃO



A maior metrópole latino-americana constitui um gigantesco laboratório de desafios e recursos.

Tem a escala necessária para gerar contracorrentes vigorosas, a ponto de sacudir e renovar a agenda da esquerda brasileira, após mais de uma década no comando do país. 

A deriva em que se encontram os serviços e espaços públicos da cidade é obra meticulosa e secular de elites predadoras.

Ao longo de décadas, a Prefeitura consolidou-se aos olhos da população como um anexo dessa lógica expropriatória, quando deveria funcionar como um escudo do interesse coletivo.

Incapaz de se contrapor à tragédia estrutural que marca a luta pela vida em São Paulo, tornou-se uma ferramenta irrelevante aos olhos da cidadania.

A tragédia se completa com o descrédito da população em relação ao seu próprio peso na ordenação institucional da cidade.

Daí para acender uma espiral de enfrentamentos bastam 20 centavos de diferença na tarifa.

Movimento Passe Livre/Facebook


A resposta é mais democracia

Saul Leblon



Não enxergar o elo entre as ruas e o ciclo histórico costuma ser fatal às lideranças de uma época.

Acreditar que o elo, no caso dos recentes protestos em São Paulo, está no aumento de 20 centavos sobre uma tarifa de transporte congelada desde janeiro de 2011, é ingenuidade.

Supor que a ordenação entre uma coisa e outra poderá ser restabelecida à base de cassetetes e pedradas é o passaporte para o desastre.

Desastre progressista, bem entendido.

A lógica conservadora nunca alimentou dúvidas existenciais ou políticas quanto a melhor forma de manter o caos nos eixos.

Esse é um apanágio do seu repertório histórico.

O colapso do trânsito, inclua-se nesse desmanche o custo e o tempo despendidos nos deslocamentos, é apenas o termômetro mais evidente de um metabolismo urbano comatoso.

Cerca de 1/3 dos paulistanos, aqueles mais pobres, residentes nas periferias distantes, levam mais de uma, e até mais de duas horas no trajeto da casa ao trabalho.

Os tempos indicados são referentes à ida; não consideram o gasto no retorno.

Os dados são de pesquisa recente do Ibope.

Não se produz uma irracionalidade desse calibre sem um acúmulo deliberado.

Estudos do Ipea reiteram a piora nas condições de transporte urbano das principais áreas metropolitanas do país desde 1992.

O Brasil tem a taxa de urbanização mais alta em uma América Latina que lidera o ranking mundial nesse indicador, diz a ONU.

O país concluiu a transição rural/urbana em três décadas, açoitado pela política de modernização conservadora do campo.

Isso se fez sob a chibata de uma ditadura militar.

E não poderia ter sido feito exceto assim.

A virulência do Estado ditatorial fez em um terço do tempo aquilo que as nações ricas levaram um século para realizar.

A coagulação da insensatez na atual "imobilidade urbana" reflete o saldo de perdas e danos dessa marcha batida da história.

O crescimento populacional desordenado das grandes cidades, agudizado pelas referidas migrações, é um dos alicerces da ruína.

Ancorada na omissão pública de décadas, a expansão irracional e especulativa da mancha urbana ganhou vida própria.

Com os desdobramentos logísticos sabidos: aumento das taxas de deslocamento e motorização; explosão dos congestionamentos e do custo do transporte na vida da cidade e no bolso de cada cidadão.

Não é figura de retórica dizer que esses ingredientes acionam o pino de cada bomba de gás lacrimogênio e faíscam o pavio de cada enfrentamento irrefletido nas batalhas campais registradas na cidade de São Paulo em menos de uma semana.

Repita-se: o conservadorismo tem certezas esféricas quanto a melhor forma de lidar com a nitroglicerina social contida nas cápsulas de concreto que ergueu no país nas últimas décadas.

Suas escolhas não podem ser as mesmas das forças progressistas.

O nivelamento regressivo acontecerá caso a inércia política ceda o comando dos acontecimentos à lógica da violência.

No caso dos protestos em São Paulo, a responsabilidade da autoridade municipal é superlativa.

Cabe-lhe reafirmar o divisor entre a gestão progressista de uma sociedade e a visão conservadora sobre os seus conflitos.

Carta Maior saudou a vitória de Fernando Haddad em 2012 por entender, como entende, que ele representa o resgate do cimento da democracia na reconstrução de São Paulo.

Mais que isso.

Por entender que a sorte de São Paulo sob a liderança da nova administração marcará o destino da agenda progressista brasileira no período em curso.

A maior metrópole latino-americana constitui um gigantesco laboratório de desafios e recursos.

Tem a escala necessária para gerar contracorrentes vigorosas, a ponto de sacudir e renovar a agenda da esquerda brasileira, após mais de uma década no comando do país.

A deriva em que se encontram os serviços e espaços públicos da cidade é obra meticulosa e secular de elites predadoras.

Ao longo de décadas, a Prefeitura consolidou-se aos olhos da população como um anexo dessa lógica expropriatória, quando deveria funcionar como um escudo do interesse coletivo.

Incapaz de se contrapor à tragédia estrutural que marca a luta pela vida em São Paulo, tornou-se uma ferramenta irrelevante aos olhos da cidadania.

A tragédia se completa com o descrédito da população em relação ao seu próprio peso na ordenação institucional da cidade.

Daí para acender uma espiral de enfrentamentos bastam 20 centavos de diferença na tarifa.

Sim, há outras nuances e interesses entrelaçados ao destaque esquizofrênico com que a mídia convoca e, depois, alardeia o caos a cada protesto.

Tais motivações são as mesmas que fizeram do tomate um astro olímpico na modalidade "descontrole dos preços", há menos de um mês.

As mesmas que hoje alardeiam "a explosão" do dólar – e, ontem, denunciavam o "populismo cambial" e os malefícios, verdadeiros, do Real sobrevalorizado.

Essas motivações exercitam sua sofreguidão cotidianamente na mesmice de uma mídia que se esboroa sob o peso de sua própria irrelevância jornalística.

A resposta da Prefeitura de São Paulo aos protestos não deve se pautar pelos uivos do jogral conservador.

Não se trata, tampouco, de conciliar com a violência gratuita.

Mas, sim, de encarar as manifestações como um mirante privilegiado para fixar uma nova referência na vida da cidade.

Qual seja, a de calafetar o abismo conservador que predominou secularmente na relação entre a Prefeitura e os moradores da metrópole, sobretudo a sua parcela mais pobre.

O trunfo do prefeito Fernando Haddad é ter sido eleito para isso.

Ele tem legitimidade para subtrair espaços à engrenagem opressora e devolvê-los a uma cidadania há muito alijada das decisões referentes ao seu destino e ao destino do seu lugar.

Um salto de qualidade e intensidade na participação democrática na gestão da cidade.

Essa é a resposta para a fornalha da insatisfação, da qual os incidentes de agora podem representar apenas um prenúncio pedagógico.

São Paulo é o produto mais representativo do capitalismo brasileiro.

Um labirinto de contradições, uma geringonça que emperra e se arrasta, desperdiça energia e cospe gente enquanto tritura e refaz o seu concreto de desigualdade.

Não há solução administrativa ou orçamentária imediata para o caos deliberadamente construído aqui.

A resposta à lógica que sequestrou a cidade dos seus cidadãos é devolvê-la a eles fortalecendo os canais existentes e abrindo outros novos, que dilatem o seu discernimento e a capacidade de erguer linhas de passagem entre o presente e o futuro.

A alternativa é a anomia, eventualmente sacudida de gás lacrimogênio e pedradas.

(*) NR: a menção ao uso de coquetel molotov nas manifestações foi suprimida do texto por se tratar de informação divulgada pelo aparato policial, sem comprovação até o momento (12/06/2013; 23h51)


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SP: Haddad condena violência de manifestantes


ATIVISMO SIM, VIOLÊNCIA NÃO



O ministro da Justiça, José Eduardo Cardoso, acionou a Polícia Federal para investigar as violentas manifestações de rua do Movimento Passe Livre.

"Eu disse e repito que não vou dialogar em uma situação de violência. A prefeitura dialoga com todos os segmentos sociais. Mas a renúncia à violência é o pressuposto de diálogo", declarou o prefeito Fernando Haddad, em Paris.


                                                                                                      SECOM/PMSP


Prefeito condena violência em manifestações contra reajuste de tarifa


O direito à livre manifestação é um dos pilares da democracia. Mas, atos de violência, depredação de ônibus e patrimônio público são totalmente condenáveis. A afirmação foi feita pelo prefeito Fernando Haddad, em Paris, nesta quarta-feira (12), pouco antes de embarcar de volta para São Paulo.

Haddad estava em Paris, onde defendeu a candidatura de São Paulo à Exposição Internacional (Expo 2020) e acompanhou as manifestações de ontem até a madrugada, conectado com seus secretários por internet e telefone. "Depois de um certo momento, quando a manifestação começou a dispersar, alguns grupos muito minoritários, inconformados com o ambiente de liberdade, passaram a provocar e a depredar. Isso não é compatível com a vida democrática. Não é liberdade de expressão. Trata-se de outra coisa, trata-se de violência gratuita", comentou o prefeito.

As tarifas de ônibus, trens e metrô foram reajustadas no início do mês em 6,7%, passando de R$ 3 para R$ 3,20. A inflação acumulada desde janeiro de 2011, data do último reajuste, foi de 14,4%. Se fosse aplicada, elevaria a passagem para mais de R$ 3,40. Nos moldes atuais, o sistema de ônibus receberá subsídios de cerca de R$ 1,25 bilhão em todo o ano de 2013.

"Nós fizemos um esforço orçamentário, também acompanhado pelo Governo do Estado, e conseguimos junto ao Governo Federal uma desoneração de tributos, o que permitiu um reajuste muito abaixo da inflação. Nos últimos anos, os aumentos têm sido reiteradamente acima da inflação. E o nosso compromisso era de reverter essa tendência, o que nós de fato fizemos", afirmou o prefeito.


"Só este ano, o reajuste de salário de motoristas e cobradores foi de 10%. Fora os anos anteriores, em que a tarifa permaneceu congelada", lembrou Haddad.

Sobre a redução de tarifas anunciada em algumas cidades, o prefeito explicou que a maioria havia feito reajuste para R$ 3,30 em janeiro e, por conta da desoneração da Medida Provisória que zerou a alíquota do PIS/Cofins, voltou para R$ 3,20. "Toda a região metropolitana aumentou para R$ 3,30 em janeiro e está reduzindo para R$ 3,20 depois de seis meses. Quem está reduzindo hoje aumentou no começo do ano. Ao contrário de todas as cidades, nós seguramos o aumento da tarifa desde janeiro. Então, não é justo com o cidadão o que está sendo dito".


O prefeito Fernando Haddad falou ainda que a violência do movimento impede um diálogo com o grupo. "Eu disse e repito que não vou dialogar em uma situação de violência. A prefeitura dialoga com todos os segmentos sociais. Mas a renúncia à violência é o pressuposto de diálogo".

Por fim, Haddad comentou o fato de líderes do movimento terem admitido que perderam o controle porque integrantes de outros movimentos teriam se juntado ao grupo. "Aí é fácil lavar as mãos. Depois do que aconteceu, você promove um movimento, não tem capacidade de liderança e aí lava as mãos. Isso é falta de democracia. Democracia é assumir responsabilidades".


Balanço

Em relação aos protestos realizados na terça-feira (11) na região central de São Paulo, a Prefeitura registrou danos e avarias em 85 ônibus e em uma viatura da Guarda Civil Metropolitana (GCM). Foram contabilizadas, ainda, 300 lixeiras (papeleiras) danificadas.


Portal PMSP

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