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quinta-feira, 14 de março de 2013

Yoani Sánchez chega a Nova York


Depois de dias intensos no México, onde participou de reunião da Sociedade Interamericana de Imprensa, em Puebla (leia mais aqui), concedeu entrevistas a veículos de comunicação, falou em Comissão de Justiça no Senado, proferiu palestra em universidade, conheceu museus, passeou... e também sofreu mais um "ato de repúdio" (!!!), parecido com aquele que experimentou no Brasil, a blogueira e ativista cubana Yoani Sánchez já está em Nova York, onde deve encontrar amigos e visitar universidades e museus.

                                        Foto: Juan Carlos Chavez     @Pressroad

Há pouco, em seu Twitter, a blogueira postou a primeira foto tirada nos EUA, junto a María José, a novaiorquina que traduz voluntariamente o blog Generación Y para o inglês.

                                Yoani e a tradutora María José            @yoanisanchez


                                Nova York       Foto: Yoani Sánchez       @yoanisanchez

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Os segredos de Francisco (o Papa)



                                                                                         Site Oficial do Vaticano


Os Segredos do Santo Padre

Carlos Alberto Lungarzo

Não é um segredo para ninguém o fato de que a totalidade das hierarquias católicas são inimigas da homossexualidade (alheia), condenam o aborto até de fetos anencefálicos (o aborto voluntário é admitido por todos os países europeus, salvo Espanha), advogam pelo celibato sacerdotal, proíbem o sexo por prazer, consideram a mulher um ser inferior etc.

Inclusive o aborto e o homoerotismo são criticados pela assim chamada “Teologia da Libertação”, tida como minoria progressista da Igreja.

Tampouco é novidade a histórica aliança de 1700 anos entre a Igreja e as grandes ordens de Cavalheiros e, depois, dos exércitos regulares, o que culminou no século XX com o apoio ao fascismo e a sua versão mais truculenta, o sangrento franquismo espanhol.

Dizer que o novo papa, Francisco, compartilha esses valores seria uma redundância.

Mas há alguns “segredos” na vida do pontífice que nem todos conhecem fora de seu país de origem. De fato, quando ele foi proclamado Papa, milhões de pessoas no mundo devem ter comprado um mapa para saber onde tinha nascido aquele homem de aspecto simpático e humilde, e biotipo de italiano do Norte. É natural que alguns desses detalhes não se conheçam.

Para os que desejem informar-se, há numerosos artigos na Internet, e até alguns livros, cujo conteúdo o próprio Francisco tentou rebater num contra-livro, só em 2010, quando sua condição de um dos grandes favoritos (já insinuada em 2005, quando ganhou o segundo lugar após Ratzinger) se tornou mais concreta.

Os interessados podem ver, entre outros muitos, os seguintes links:

http://www.redebrasilatual.com.br/temas/internacional/2013/03/novo-papa-e-associado-a-sequestros-de-jesuitas-e-de-bebe-durante-ditadura

http://www.cbsnews.com/8301-202_162-57574147/jorge-bergoglio-who-is-the-new-pope/

http://www.advivo.com.br/blog/antonio-ateu/vaticanao-o-papa-da-ditadura-militar-argentina

O leitor encontrará também outros textos, alguns escritos por organizações que assinam como católicas. Eventualmente, como em todos os casos, alguns textos podem não ser 100% verídicos, mas eu não estou fazendo uma acusação. Estou apenas informando de acusações feitas por outros, e cabe ao leitor se perguntar: “Qual seria o interesse dessas pessoas em criticar um humilde servidor de Deus?”

A Argentina voltou à normalidade democrática em 1983 quando o então padre Bergoglio estava com 47 anos. Nessa época, o atual papa era reitor do Colégio Máximo San José (da cidade de San Miguel), o maior seminário de formação de sacerdotes da Argentina (1980-1986) após ter sido, entre 1973 e 1979, o principal chefe (dito, na gíria eclesial, provincial) da poderosa e influente ordem dos jesuítas.

Sendo a Argentina um país absolutamente católico, sem qualquer miscigenação com religiões nativas como no resto das Américas, e tendo como exceção apenas uma comunidade judia que sempre padeceu perseguição (e alguns evangélicos e islâmicos), tudo o que faz a Igreja foi sempre claramente percebido pelo resto da sociedade. Aliás, ainda hoje, a Argentina talvez seja o único país (não sei o que acontece atualmente na Polônia, mas eventualmente poderia ser um de dois casos) em que a Igreja não está separada do Estado. Por exemplo, o Estado paga um salário aos bispos (não sei se Bergoglio o aceita ou o doa), mas já houve um conflito com o Vaticano quando Nestor Kirchner quis tirar a mensalidade de uns 3.000 dólares a um bispo que propôs que o ministro Gines, defensor da camisinha, devia ser linchado.

Em 1983, Jorge Bergoglio, uma figura austera, silenciosa, alheia a chamar a atenção, não tinha nenhuma influência política evidente, mas acumulava muita influência invisível. Ele utilizou essa influência para tentar mostrar um rosto “moderno” da Igreja, modificando a imagem desta como cúmplice qualificado e ativo dos genocídios e torturas generalizadas, que foram comuns na Argentina muitas vezes.

Por que fez isto? Muito simples. Apesar de ter mais de 90% de católicos e da mística medieval que impregna quase todas as instituições da Argentina (pelo menos, até a última vez em que eu estive em meu país de origem), a Igreja ganhou um enorme número de inimigos combatentes, muitos dos quais, de maneira paradoxal, continuavam se considerando católicos.

Esses inimigos formavam um grande grupo de pessoas que eram parentes, amigos ou conhecidos qualificados dos desaparecidos pela ditadura de 1976. O número de mortos em tortura e depois desaparecidos foi tradicionalmente fixado em 30.000 no ano de 1978, mas eu acredito que o número total deve ser muito maior, provavelmente entre 35.000 e 42.000, tendo em conta que a ditadura continuou até 1983.

(Não é este o lugar para justificar esta afirmação que surge de documentação dispersa, e de documentos internacionais parcialmente desclassificados.)

Unidos aos parentes dos 1.200.000 exilados, refugiados e asilados pelo mundo (ou seja, 3% dos habitantes do país nesse momento), os familiares e amigos dos desaparecidos deviam somar algo como 6 milhões, o que significa 20% da população. Calculo que, embora muitas pessoas não tivessem parentes nem amigos, é razoável considerar que a média de afetos por cada exilado ou desaparecido seja de 5 pessoas.

Como é bem conhecido, a Igreja Católica apoiou intensa e devotadamente os crimes da ditadura, não apenas encobrindo ou justificando-os, mas também dando apoio psicológico e propagandístico, colocando a seu serviço seu aparato internacional (incluída a máfia italiana e o grupo P2), abençoando as máquinas de choque e os instrumentos usados para mutilação, e até, em vários casos, aplicando tortura com suas próprias mãos.

Há pelo menos 40 livros em espanhol e pelo menos 15 em inglês dedicados de maneira total ou parcial à cumplicidade da Igreja Católica com os crimes de Estado na Argentina nos anos 1976-1983, e milhares de páginas de Internet.

De todos os casos de católicos aliados da ditadura, o mais espantoso é o do padre Christian Wernich, condenado em 2007 a prisão perpétua. Os que sobreviveram a seu sacerdócio afirmam que, de todos os torturadores civis e militares, ninguém era tão temido como o santo confessor. Ele chamava “fazer a barba” a passar a máquina elétrica, mas esta não era a máquina de barbear, mas de aplicar choque.

Com seu estilo discreto, Bergoglio tentou jogar um manto de esquecimento nos fatos protagonizados por uma das mais poderosas e compactas igrejas do planeta, num dos países mais católicos do mundo, junto com a Polônia e a Irlanda. Não sabemos se ele conseguiu refrear a saída de fieis da Igreja, já que no ano 2000 menos de 10% do país assistia regularmente a missa. Mas, ele fez grandes esforços e até permitiu a jornalistas estrangeiros que redigissem biografias sobre ele, e escreveu sua própria versão de sua vida, tentando refutar algumas dúzias de testemunhos que o acusavam de ter participado ativamente na ditadura. Ele fez um trabalho similar ao de Pio XII, quando, depois da guerra, tentou disfarçar, sem nenhum sucesso, a estreita colaboração do Vaticano com o nazismo.

Mas, antes de 1983, como era a relação de Francisco com a ditadura?


Jesuítas e Crianças

Como em muitos outros países, uma minoria de padres apoiou a causa dos direitos humanos e teve certa militância no que foi chamado “Teologia da Libertação”.

Dois deles foram os jesuítas Orlando Dorio e Francisco Jalic, que propagavam uma visão social do cristianismo em favelas e bairros populares. Estes padres foram capturados pelos esquadrões da morte dos militares e submetidos a tortura, mas conseguiram sobreviver. Enquanto Jalic se fechou num mosteiro alemão e nunca mais falou de seu passado (e, possivelmente, nunca voltou a Argentina), Dorio acusou explicitamente a Bergoglio, que era a máxima autoridade de jesuítas, de ter negado proteção, e ter permitido que ele fosse capturado.

Em vários dos links citados, especialmente no editado pela UNISINOS, há numerosos detalhes que descrevem, em total, uma quantidade apreciável de testemunhas. Embora a mídia brasileira tenha ignorado estas afirmações e diga que são simples conjecturas, um número tal de testemunhas seria possivelmente aceito por um tribunal penal.

Bergoglio usou por duas vezes os privilégios de não acatar as decisões da justiça, privilégio que a Argentina concede aos bispos, que têm um fórum privilegiado equivalente ao dos deputados, senadores e presidentes. Em função disso, recusou dar depoimento aos tribunais que julgaram os crimes contra a humanidade na época da ditadura.

Bergoglio aceitou, porém, comparecer a uma terceira intimação, quando a pressão dos milhares de vítimas se tornou muito intensa.

Segundo a advogada Myriam Bregman, que trabalha em direitos humanos, as afirmações de Bergoglio, quando aceitou ir aos tribunais, mostram que ele e outros padres eram coniventes com os atos praticados pela ditadura. Ele, porém, não foi indiciado, também com base na “falta” de provas.

Em 1977, a família De la Cuadra - formada por ativos defensores de direitos humanos (cuja matriarca Licha, 1915-2008, foi condecorada pelos governos democráticos posteriores à ditadura) - teve sequestrados cinco de seus membros, dos quais apenas um reapareceu muito depois.

O padre Bergoglio se recusou a indagar onde eles estavam e até a ajudar a procurar uma criança recém nascida, filha de uma das mulheres desaparecidas.

Em algumas ocasiões, o Santo Padre não pode refutar que a ditadura argentina tinha feito numerosas atrocidades, mas argumentou que isso foi uma resposta provocada pela esquerda, que, segundo ele, também teria usado o terror. Este infame argumento, como todos sabem, foi fortemente repudiado em todos os países que tiveram ditaduras recentemente.

Durante o governo de Néstor Kirchner e, após, o de sua esposa, Cristina Fernández, o atual papa, mantendo seu estilo “sutil”, aproveitou para criticar muitas vezes ao governo (que, como o governo brasileiro, subiu ao poder pelo voto popular), o acusando de ditatorial, de gerar o caos, de defender pessoas de vida sexual “abominável”, etc.

Com seu estilo aparentemente moderado, Bergoglio teve certo sucesso onde outros padres, que pregaram abertamente a tortura e o genocídio dos ateus e marxistas, fracassaram. Com efeito, apesar de ser unanimemente repudiado pelos defensores de direitos humanos, inclusive os católicos, ele nunca foi processado, como aconteceu com o padre Wernich, e até conseguiu forjar uma máscara de tolerância.

A Luz Protegida

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O Papa pobre, no suntuoso Vaticano


Pouco a pouco nos acostumamos a ouvir e a ver, através dos meios de comunicação, a crônica negra da sociedade contemporânea... O império do dinheiro, com seus efeitos demoníacos como as drogas, a corrupção, o tráfico de pessoas (incluindo de crianças), junto com a miséria material e moral são frequentes. 
                                                                     Cardeal Jorge Mario Bergoglio, o novo papa


Conservador moderado, preocupado com as mazelas do mundo, intelectual politizado, bem-humorado, discreto, conciliador, amante de livros e poesia, crítico da pobreza e da corrupção, humilde, 
que prepara as próprias refeições.

Devoto do primeiro Francisco, o de Assis, o Santo dos Pobres e Defensor dos Animais, Papa Francisco I foi eleito ontem, para comandar a Igreja, conduzir um rebanho de 1,2 bilhão de católicos no mundo, transitando no luxuoso Vaticano, com suas intrigas, fogueiras de vaidade e disputas de poder.



Papa Francisco: um príncipe pobre no luxo vaticano


Perfil de homem modesto esconde uma voz sempre disposta a denunciar a pobreza, a corrupção e a desigualdade social

Renata Malkes 



O então arcebispo de Buenos Aires, 

Jorge Mario Bergoglio    AP

Rio — Assim que tornou-se pública a identidade do novo Papa, rótulos surgiram atrelados ao nome de Jorge Mario Bergoglio. “Flexível”, para quem guarda na memória uma imagem de 2001, quando ele lavou e beijou os pés de 12 pacientes com Aids durante visita a um hospital. “Conservador moderado”, na definição de alas da Igreja que veem no argentino alguém que conseguiu conter o avanço de correntes liberais entre os jesuítas, ao mesmo tempo em que representa as mazelas do mundo em desenvolvimento. “Ultraconservador” é a aposta dos argentinos que lembram do então arcebispo de Buenos Aires combativo, firmemente contrário à adoção do casamento gay no país em 2010. E “incógnita”, para quem recorda o ataque desferido em setembro passado contra padres que se recusaram a batizar crianças nascidas fora do casamento na Argentina. O adjetivo que melhor parece definir o ex-arcebispo de Buenos Aires, porém, é outro — humilde.

Aos 76 anos, o primeiro Pontífice jesuíta e latino-americano é conhecido como um intelectual politizado, que desprezou o conforto da moradia oficial da arquidiocese para viver num quartinho simples no segundo andar de um prédio anexo à Catedral de Buenos Aires. Abriu mão de carros oficiais e viajava de ônibus e metrô para realizar seu trabalho pastoral, sendo fiel aos votos de pobreza de São Francisco de Assis, a quem homenageou quando aceitou ontem tornar-se o Papa Francisco. E quem o conhece já questiona como alguém tão modesto vai se adequar à suntuosidade do Vaticano.



Biografia bem antes de chegar à Santa Sé

A retrospectiva da vida do Papa Francisco vai mesmo ao encontro da primeira impressão deixada ontem. No primeiro discurso diante de milhares de fiéis que se aglomeraram na Praça de São Pedro, ele exalou tranquilidade e deixou escapar sorrisos. Passou a imagem de um Pontífice bem-humorado e até brincalhão, que não titubeou ao dizer que a Igreja fora buscá-lo “quase no fim do mundo”. Humano.

Os jornalistas Sergio Rubín, um argentino especializado em religião, e a italiana Francesca Ambrogetti, radicada em Roma, concordam. Desde 2005, a dupla percebeu a personalidade intrigante do cardeal que quase foi eleito Papa e escreveu sua biografia, “O Jesuíta”, lançada em 2010. Baseado numa série de encontros com o então cardeal, o livro relata um Bergoglio quase caricato para um argentino: fã de tango e torcedor apaixonado do San Lorenzo de Almagro, um dos cinco maiores clubes de futebol local, fundado, curiosamente, por um padre salesiano, Lorenzo Massa.

A dupla garante, ainda, que Papa Francisco é bem-humorado, do tipo que conta piadas sobre religião e até sobre os padres. E também gosta de cozinhar a própria comida, tarefa que aprendeu ainda menino, com a mãe.

— Bem, nunca matei ninguém — disse ele, certa vez, em tom de galhofa, sobre o resultado de suas experiências culinárias.

Colegas contam que, nas reuniões do Vaticano, o então cardeal gostava de se sentar nas últimas fileiras. Tentava a todo custo se manter discreto, mas, desde 2005, isso ficou difícil. E a analogia ao futebol é adequada: no conclave que elegeu o cardeal Joseph Ratzinger, fora justamente o jesuíta argentino seu principal desafiante. Segundo um diário anônimo do conclave, que vazou à imprensa em setembro daquele ano, Bergoglio teria recebido 40 votos na terceira votação. Mas acabou desistindo da disputa, em parte, devido a uma denúncia que manchou sua reputação três dias antes da abertura do conclave. Um advogado de direitos humanos entrara com uma ação na Justiça acusando o arcebispo de Buenos Aires de cumplicidade no sequestro de dois padres jesuítas em 1976, sob a ditadura militar argentina. Segundo o vaticanista John Allen Jr., ele também foi vítima de uma campanha negativa por e-mail, aparentemente orquestrada por colegas da Companhia de Jesus. Ele negou veementemente todas as acusações.

Até o fato de ter renunciado àquela disputa com Ratzinger parece ter-lhe rendido pontos na Cúria Romana — ainda que ele não seja um homem de carreira nos círculos administrativos da Igreja. Numa entrevista ao diário “La Stampa”, no ano passado, deu sinais de estar ciente dos problemas da contestada Cúria. Mas apontou-os com sutileza.

— O carreirismo e a busca de uma promoção vêm sob a categoria do mundanismo espiritual. A Cúria Romana tem seus pontos negativos, mas eu acho que muita ênfase é colocada nesses aspectos negativos, e não na santidade dos numerosos sacerdotes e leigos que trabalham nela — declarou.

Esse tom conciliador parece se refletir na própria escolha de Bergoglio para o Trono de Pedro. Nascido em Buenos Aires, em 17 de dezembro de 1936, ele é filho de um ferroviário italiano que emigrou de Turim para a Argentina, onde teve cinco filhos — uma eleição certeira, capaz de apaziguar a majoritária ala italiana da Cúria ao mesmo tempo que acena para o mundo em desenvolvimento.



Sem pulmão, mas com fôlego para a política

O jovem Bergoglio sonhava em ser químico e chegou a completar um curso técnico. Mas, aos 21 anos, optou pelo sacerdócio e, em 1958, entrou na Companhia de Jesus — dez anos depois de perder um dos pulmões devido a uma infecção respiratória. Foi ordenado sacerdote em 1969 e, durante a ditadura argentina, ascendeu ao comando provincial dos jesuítas.

O novo Pontífice fala espanhol, italiano e alemão. Construiu toda sua carreira eclesiástica na Argentina — exceto por dois breves períodos vividos no Chile e na Alemanha, onde estudou. Amante da poesia e dos livros, ele revelou a seus biógrafos ser um leitor voraz, apreciador de Fiódor Dostoiévski e Jorge Luis Borges, “um sábio, um agnóstico que todas as noites rezava o Pai-Nosso porque havia prometido à mãe”. Até a revista do Partido Comunista da Argentina era lida com atenção, embora o Papa tenha ressaltado:

— Nunca fui comunista.

Pelo contrário. Ele chegou até a combater os partidários da Teologia da Libertação e os lampejos marxistas nos anos 70, pois fazia questão de se manter fiel ao Evangelho. A batina, porém, não ofuscou sua vocação para a política. Conhecido pelo enfoque no trabalho pastoral e na obra social, Bergoglio fez das críticas a pobreza e corrupção suas marcas registradas.

Teve, desde 2003, embates duros com o governo kirchnerista. Em suas homilias, atacava não só a situação social da Argentina como o “clima de confrontação política” do país. E depois de irritar o ex-presidente Néstor Kirchner em várias ocasiões, a batalha se estendeu à atual presidente e viúva, Cristina Kirchner, que não raro o acusa de ingerência indevida nos assuntos de Estado.

Os dois, aliás, parecem travar uma guerra particular. A militância de Bergoglio não conseguiu impedir a Argentina de tornar-se o primeiro país latino-americano a autorizar o casamento gay, em 2010. Ou barrar determinações do governo de Cristina, autorizando, por exemplo, a distribuição de anticoncepcionais gratuitos. Certa vez, o então arcebispo disse que as adoções de crianças por casais homossexuais eram uma discriminação contra os menores. A presidente reagiu, classificando as declarações como “da época medieval e da Inquisição”.

Bergoglio cometeu algumas faltas, mas foi jogador de peso na arena nacional de seu país. Agora, porém, será testado como numa Copa do Mundo da religião. E com 1,2 bilhão de católicos no planeta, torcida não faltará para que o Papa da Argentina siga a tradição dos gramados: ataque os adversários, faça gols e leve ao Vaticano a inspiração — e a graça — do futebol azul e branco.


O Globo Online

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