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sábado, 26 de fevereiro de 2011

Dilma e a "rebelião da toga"

Todos nós aguardamos com ansiedade o desfecho do "caso Battisti", que voltou ao STF por interferência do ministro Cezar Peluso. O presidente do Supremo, contrariando a expectativa de muitos ativistas e juristas, não libertou o escritor italiano Cesare Battisti após o presidente Lula decidir soberanamente por sua não extradição para a Itália.

Em início de governo, mais um "desafio" vindo do Judiciário é apresentado para a presidenta Dilma encarar.

Uma questão que envolve "reposição salarial", de cunho portanto econômico, está sendo colocada como questão política pela Associação dos Juízes Federais, envolvendo a relação independente e harmônica dos três poderes da República.

A AJF não aceita a decisão da presidenta Dilma de não negociar com a categoria, afirma que não se deixará intimidar e cogita colocar na interlocução com o governo o ministro da Defesa e jurista Nelson Jobim e o também jurista vice presidente Michel Temer.

Abaixo a notícia detalhada. Vamos acompanhar o desenrolar da questão aqui, e ver como se sai a presidenta Dilma diante das pressões e ameaça de uma eventual "rebelião da toga".



Juiz insinua que governo trata categoria como sindicato de motorista


Presidente da Associação dos Juízes Federais afirma que Planalto não pode igualar Judiciário a outras categorias; sindicato de motoristas promete processo


Fausto Macedo/O Estado de S. Paulo

A toga se declarou nesta sexta-feira "perplexa, chocada" com a decisão da presidente Dilma Rousseff (PT) de não negociar com a categoria, que reivindica reajuste de 14,79% a título de reposição de perdas inflacionárias. "O governo não pode tratar sua relação com outro poder, que é independente, como se estivesse negociando com sindicato de motorista de ônibus", declarou o presidente da Associação dos Juízes Federais, Gabriel Wedy.

Para Wedy, "o governo precisa evidentemente fazer essa distinção, não pode desconhecer o magistrado como agente político do Estado". A entidade subscreve mandado de injunção ao Supremo Tribunal Federal, por meio do qual os magistrados pleiteiam a reposição sob argumento de que a omissão do Congresso lhes subtrai direito constitucional de irredutibilidade de vencimentos.

Em agosto de 2010, o STF enviou projeto de lei ao Legislativo reivindicando os quase 15%, mas não houve resposta até agora dos parlamentares. A pretensão dos magistrados esbarra na disposição do Palácio do Planalto de promover um ajuste nas contas públicas após o corte de R$ 50 bilhões do orçamento.O governo avisa que não vai se curvar a pressões.

"Ficamos impressionados com essa reação do governo em início de gestão dizendo que vai ficar mais um ano descumprindo a Constituição", afirma Gabriel Wedy. "O governo foi muito inábil, com uma declaração duríssima." "Causa espanto o governo nos comparar a outras categorias", insiste. "Falta tato político ao governo. É importante que a presidente Dilma realize uma interlocução de forma mais qualificada com o STF e com a magistratura do País. Não se está discutindo aumento de salário, mas a funcionalidade do teto constitucional."

Os magistrados elegeram o ministro Nélson Jobim (Defesa) para o papel de negociador e vão pedir a ele que aceite a missão. Na próxima semana vão solicitar reunião com Jobim, a quem consideram qualificado para levar ao governo os argumentos e as razões da classe. Jobim foi ministro da Justiça e presidente do STF. "Ele criou o teto constitucional, quando presidiu o Supremo", destaca Wedy. "É muito respeitado por toda a magistratura e pode resolver esse impasse pela habilidade que tem como jurista e constitucionalista. Pode assessorar a presidente Dilma, tem o perfil ideal."

Michel Temer, vice presidente da República, também poderá ser assediado, segundo planeja a toga. "Temer pode auxiliar o governo para a elevação do nível do debate como constitucionalista que é, tornando-o mais técnico, qualificado e menos emotivo", avalia o presidente da associação dos juízes. "Queremos resolver o impasse."

Os juízes consideram o teto moralizador. "Quando o teto para o funcionalismo foi criado tinha servidor público que ganhava R$ 80 mil de salário", anota Wedy. "Nós defendemos o teto. A questão envolve muito mais direito constitucional do que economia. Por isso, precisamos qualificar o debate."

"O governo não pode ignorar o fato de que os juízes são agentes políticos do Estado com garantias constitucionais que não são nossas, mas da sociedade", adverte o presidente da Associação dos Juízes Federais. Essa declaração de endurecimento do governo, esse tipo de balão de ensaio largado pelo governo não vai nos intimidar, não vai fazer com que a gente pare de negociar." Para os juízes, "a negociação entre um poder de Estado e outro se dá em moldes diferentes da relação entre o governo e um sindicato".

Wedy observa que consta do artigo 2.º da Constituição que os poderes são independentes e harmônicos. "O governo precisa ter a dimensão que está negociando com um outro poder de Estado, que é o STF."

(colaboração Lucas de Abreu Maia)

Portal O Estado