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quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Presidenta Dilma: vai ou não vai encarar a mídia?

Quatro dias após Dilma Roussef ser eleita Presidenta (é assim que ela prefere ser tratada) da República do Brasil, os sinais dados por ela na direção da mídia (golpista) já nestes primeiros dias nos parecem auspiciosos.

Dilma, que não recebeu por parte desta mídia tratamento sequer equilibrado, pelo contrário, muitas vezes foi tratada até com grosseria e ignorância por veículos descaradamente partidarizados, em campanha feroz a favor do candidato das elites, no seu primeiro pronunciamento ao povo brasileiro ainda no domingo à noite, deixou claro seu compromisso no cumprimento implacável da Constituição, que como se sabe contém dispositivos que contemplam a questão da democratização da mídia e da comunicação no País.

No dia seguinte, a Presidenta Eleita, saindo do discurso para a prática, rompeu a "tradição lulista" de falar sempre em primeiro lugar à emissora global e concedeu sua primeira entrevista televisiva a duas jornalistas da Rede Record, Ana Paula Padrão e Adriana Araújo. Depois disso, falou para os telejornais da Globo, Band e SBT, e deu entrevista coletiva a jornalistas de vários órgãos no Palácio do Planalto logo após o feriado. Quando indagada sobre a questão Comunicação no Brasil, deixou sempre muito clara sua defesa da irrestrita liberdade de imprensa, mas também da necessidade de serem definidos marcos regulatórios para o setor.

As indagações que se levantam agora é como Dilma Presidenta se relacionará ao longo do mandato com a mídia que tantas vezes a destratou enquanto candidata; como será tratada, como Presidenta da República, por esta mesma mídia; e como seu governo se conduzirá na regulação do setor e na democratização dos meios de comunicação.

Dilma se comportará como Lula e Bachelet, presidente do Chile, que preferiram não confrontar a mídia? Ou, fazendo jus a sua história de ex-guerrilheira, encarará sem medo, de peito aberto, as oligarquias midiáticas e seus interesses mesquinhos?


Para introduzir essa questão aqui, reproduzo abaixo post do blog Escrevinhador, de Rodrigo Vianna, escrito meses antes da eleição, quando já se discutia as relações com a imprensa num eventual governo de Dilma.


Dilma, se eleita, vai enfrentar a imprensa?

publicada domingo, 15/08/2010 às 18:49 e atualizada segunda-feira, 16/08/2010 às 11:57





A senhora à esquerda evitou o confronto; a senhora à direita preferiu o combate aberto


Numa reunião dia desses, um amigo blogueiro disse-me que não vê a hora de passar a eleição, pra que ele não se sinta mais “obrigado” a defender Dilma diante do descalabro de fichas falsas, terrorismo eleitoral e grosseria de apresentadores canastrões.


Concordei com esse amigo. Também não vejo a hora dessa pancadaria passar, pra que a gente possa exercer a função crítica de imprensa, em vez de passar o tempo mostrando como a velha mídia distorce os fatos e mente sem parar. Chegamos até a brincar:  como a oposição vai “acabar” em outubro, restará a nós fazer a verdadeira oposição no Brasil.


Outro sujeito que estava na reunião olhou pra gente e sacudiu a cabeça: tsh, tsh. E apresentou outra visão: “vocês estão enganados; a pancadaria está só começando; passada a eleição, se Dilma ganhar, será ainda pior; veremos no Brasil algo parecido com o que Cristina Kirchner sofre na Argentina”.


Parei pra pensar.


Na verdade, diante de um possível governo Dilma temos essas duas possibilidades:


- a oposição se enfraquece a tal ponto que as forças conservadoras (no empresariado e até na velha mídia), em vez de se somar a DEM e PSDB, vão se aproximar do governo da petista, disputando espaços e empurrando o governo mais pra direita; nesse caso, haveria lugar para uma oposição pela esquerda se fortalecer (desde que tenha conexão com movimentos sociais, com o mundo real, e não negue os avanços da era Lula, mas incorpore esses avanços e lute para profundar as mudanças);


- a oposição se torna menor, sim, mas por isso mesmo mais aguerrida, mais barulhenta, mais golpista; encastelada na mídia e em alguns setores do Judiciário e do Parlamento, fará um combate permanente a Dilma, nos moldes do que ocorreu por exemplo na Argentina; nesse caso, os setores mais críticos, inclusive na blogosfera, seguirão a ter um papel fundamental para desfazer as tentativas de golpes e manipulação.


Se esse segundo cenário prosperar, Dilma agirá como Cristina ou como Bachelet?


Você, caro leitor, aposta no que?


O leitor Victor Farinelli envia-me ótimo texto exatamente sobre esse tema. Confira



Dilma, Cristina e Bachelet


por Victor Farinelli


Moro no Chile desde 2005, cheguei aqui durante as eleições vencidas pela Bachelet, e acompanhei todo o mandato dela.


Li no Conversa Afiada as considerações do cunhado do Paulo Henrique Amorim, sobre como a direita chilena conseguiu chegar ao poder apesar de a esquerda ter um governo exitoso e uma presidenta popular. Assino embaixo quase (*) tudo o que foi dito, e acrescento que a popularidade da chilena Michelle Bachelet foi um fenômeno quase inexplicável, porque o PIG daqui bateu nela do primeiro ao último dia de mandato. A ira da imprensa brasileira contra a Dilma tende a ser igual ou pior – tanto que na Argentina foi pior, e por isso a Cristina Kirschner fez a Ley de Medios e mostrou como o Clarín chafurda na própria lama.


Os PIGs contra presidentas foram mais que a oposição desrespeitosa, como foram com presidentes progressistas homens. Foram desrespeitosos e machistas.


É isso que espera a Dilma, uma imprensa ferozmente opositora, desrespeitosa e machista.


No Chile, a Bachelet e todos os anteriores presidentes da Concertación apanharam do PIG nativo, mas, tal qual Lula no Brasil, mantinham um inexplicável masoquismo, jamais ameaçaram a hegemonia dos barões da mídia.


Inclusive, quando os herdeiros do Clarín chileno (o jornal que defendeu Allende até o último dia, e que foi extinto pelo Pinochet) tentaram reabrir o antigo diário, foi justamente o governo concertacionista quem impôs as maiores dificuldades. Assim, como Lula, que não fomenta as condições pra consolidação de novos meios que realizem o necessário debate.


E pior, como mostrou o Blog do Miro recentemente, continua dando aos principais meios do PIG brazuca as verbas publicitárias que eles necessitam prá sobreviver e continuar a atacá-lo sistematicamente.


A melhor forma de fazer a Dilma ver as consequências de ser condescendente com o PIG é contrastar a atitude da presidenta argentina com a da chilena.


Bachelet agiu como Lula, manteve sua popularidade, mas viu a Concertación sucumbir eleitoralmente – embora seja irreal atribuir a derrota somente a esse erro, houve outros, a começar pela péssima escolha do candidato a sucessor, como escreveu, na época, o Rovai.


Cristina apanhou como Lula e Bachelet (e como irá apanhar Dilma). Mas reagiu!! Democratizou os meios e vem mudando radicalmente o processo de formação da opinião da classe média.


Hoje, os argentinos sabem, por exemplo, que o principal nome da oposição argentina, Mauricio Macri (ex-presidente do Boca Juniors e atual governador da cidade autônoma de Buenos Aires), defende que não se aceitem bolivianos ou paraguayos nos hospitais públicos da capital. Antes, o PIG albiceleste escondia ou tergiversava essas declarações comprometedoras. Agora, é muito mais difícil tapar o sol com a peneira.


A Dilma precisa conhecer profundamente as consequências do que fizeram Michelle Bachelet e Cristina Kirschner. Assim, quando vierem os ataques do nosso PIG, o desrespeito, o machismo e o fomento ao golpe, ela terá maior consciência de como se deve reagir.


(*) duas retificações:
1) Se fizermos uma média dos quatro anos, a popularidade de Michelle Bachelet vai ficar em torno aos 70%, como disse o texto do Conversa Afiada, mas no momento em que entregou o cargo, a então presidenta reunia 84% de aprovação – o maior índice já apresentado por um presidente chileno ao fim do seu mandato.
2) Piñera não cumpriu toda a promessa. Vendeu Lan Chile, prum testa de ferro da família, mas a promessa era vender Lan, Chilevisión e as ações do Colo Colo, e as demais vendas continuam pendentes, com destaque pro canal Chilevision, que tende a ser vendido (ou não) somente depois que Piñera tome decisões vitais com respeito a televisão digital, e nada impede ele de favorecer o canal do qual ele ainda é o dono.


(do Blog Escrevinhador, http://www.rodrigovianna.com.br/)